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Nota de corte em concursos públicos: entenda como o cálculo é feito

Para passar na prova de um concurso, o candidato precisa alcançar uma pontuação responsável por delimitar a classificação de uma determinada fase

Para ter uma melhor compreensão sobre um concurso, é importante que o candidato compreenda os aspectos que afetam as avaliações da seleção. - Foto: Adobe Stock
Para ter uma melhor compreensão sobre um concurso, é importante que o candidato compreenda os aspectos que afetam as avaliações da seleção. - Foto: Adobe Stock

Em um concurso público, a etapa mais aguardada pelo candidato é a realização do primeiro tipo de avaliação. Nesse caso, geralmente, os editais destacam uma prova objetiva de múltipla escolha para todos os cargos ofertados. Ainda, há a possibilidade de um exame dissertativo ser aplicado no mesmo dia. Assim, para passar na prova, além de ter um bom desempenho, o participante precisa alcançar um delimitador de classificação, conhecido como nota de corte.

Conforme o Art. 7º da Lei 14.965, de 9 de setembro de 2024, um dos tópicos que deve conter nos editais é o tipo de prova e os critérios avaliativos. Assim, o Art. 9º consta que os exames precisam avaliar os conhecimentos, as habilidades e, em alguns casos, as competências necessárias para o cumprimento das atribuições do cargo.

Com isso, muitas etapas de um concurso possuem uma nota de corte, ou seja, uma pontuação mínima exigida para a habilitação em uma fase. Aqueles que não conseguem alcançá-la são eliminados do processo.

Mas esse ponto não é fixo, já que o seu cálculo depende de uma série de fatores. No entanto, vale compreender que essa nota acontece naturalmente nos certames, pois ela está atrelada ao desempenho dos concurseiros em meio à concorrência.

Esse mesmo sistema está presente em outros tipos de seleções, como nos vestibulares. O conceito básico é semelhante, mas a sua aplicação difere um pouco de como ocorre nos concursos.

Como funciona a nota de corte em concursos públicos?

Willian de Paula, auditor fiscal tributário da cidade de São Paulo e professor na Guruja Concursos, diz que a nota de corte é estabelecida pela pontuação obtida pelo último candidato classificado para a etapa seguinte do concurso ou aprovado dentro das vagas ofertadas.

“Por exemplo, se apenas os 50 melhores avançam para a próxima fase, a nota de corte será a pontuação do 50º colocado. No resultado final, a pontuação será a do último classificado dentro das vagas”, explica.

Ele ainda complementa com outro exemplo: “Em um concurso com quatro vagas imediatas e duas fases, com uma prova objetiva e 20 discursivas a serem corrigidas, a nota do 20º colocado será a nota de corte para a correção das discursivas. Após esse procedimento, a nota do 4º colocado será a nota de corte final”.

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Conforme Jeferson Rosa, mentor para concursos públicos e auditor fiscal da Receita Federal, essa nota pode ser dividida em dois tipos: nominal ou real.

A primeira é aquela que já está pré-estabelecida em um edital, servindo como parâmetro para a habilitação nas etapas do processo e possuindo diversos modelos. Um deles é quando o certame prevê a habilitação apenas para três vezes do número de vagas, para que a prova discursiva seja avaliada.

“Outro exemplo é a habitação para quem acertar, pelo menos, uma questão em cada disciplina. Ou, então, só estará habilitado quem tiver o mínimo de 50% de acertos na prova de conhecimentos gerais. Ou, até mesmo, só estarão habilitados para a próxima fase os 50 mais bem classificados”, ilustra Jeferson.

Vale citar que o termo “habilitado” não significa “aprovação”, mas sim que o participante conquistou a classificação necessária para passar em uma fase da seleção.

Já a nota de corte real depende da realização da prova e do resultado dos candidatos. Nesse caso, é considerada a hierarquia da soma dos pontos obtidos pelo concurseiro. Jeferson comenta que esse modelo é uma consequência prática do que foi obtido pela pontuação nominal.

“A nota de corte nominal para a classificação das 50 primeiras notas é concretizada com a real de todos que alcançaram as 50 primeiras notas como, por exemplo, 96 pontos de 100 disponíveis. Neste caso, a nota de corte real será 96 pontos”, explica.

Diferença entre a nota de corte em vestibulares e em concursos públicos

No Brasil, várias pessoas passam por provas de diversos tipos de processos seletivos e com diferentes objetivos, como os concursos públicos e os vestibulares. De acordo com um levantamento da Associação Brasileira de Estágios (Abres), 15.120.827 de candidatos se inscreveram em vestibulares em 2021. No entanto, apenas 3.944.897 conseguiram ingressar em uma faculdade – representando 26,09%.

Quando se trata de concursos, 5.070 pessoas conseguiram ingressar no Executivo Federal por esse tipo de seleção em 2021. O levantamento é da República em Dados, com base nos dados do Painel Estatístico de Pessoal. Em 2024, por exemplo, esse número foi de 6.157. Nesse caso, a maior taxa ocorreu em 2010, com 42.873 ingressantes na esfera federal por meio de concursos públicos.

Embora o vestibular seja voltado para o ingresso em universidades e faculdades e o concurso tem o intuito de convocar servidores para trabalhar em cargos públicos, a nota de corte é um sistema que está presente nas avaliações desses dois processos. No entanto, a sua aplicação é diferente.

Willian destaca que essas pontuações nos vestibulares costumam ser mais previsíveis, até mesmo por terem uma base em dados históricos. Em um concurso, a nota de corte é bem particular, pois depende da banca organizadora e das disciplinas cobradas nos exames, por exemplo. “De certo modo, ela reflete a relação entre a competitividade dos candidatos e a dificuldade da prova”, diz.

Uma das características dessa nota em concursos públicos é justamente a sua variedade. Cada certame possui um indicador específico, pois o seu estabelecimento depende do interesse da instituição, da quantidade de inscritos, do nível da avaliação e, até mesmo, da distribuição das vagas.

Jeferson ressalta que no caso da pontuação nominal, ela sempre terá o seu modelo, quantitativo e a estrutura de cálculo especificados no edital. Isso porque essa é a maneira de manter a integridade e isonomia do certame.

Ele ainda complementa: “Há notas de corte que consideram algumas condições do participante como, por exemplo, pessoas com deficiência (PcDs), quem estudou em escola pública ou pretos e pardos (PP)”, comenta.

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Com isso, observa-se que a pontuação que habilita um candidato em uma determinada fase vale tanto para a ampla concorrência quanto para as vagas reservadas. Conforme Willian, nesse caso, cada categoria possui a sua própria nota de corte, baseada no desempenho em uma determinada modalidade. “Se há três vagas para uma cota, a nota do terceiro colocado será a de corte para os concorrentes desse grupo”.

Como a nota de corte em concursos é calculada?

O cálculo da nota de corte em concursos é feito com base nas pontuações obtidas pelos concurseiros em uma avaliação e no limite estabelecido para a classificação. O auditor fiscal tributário Willian de Paula ilustra o seguinte: se 100 candidatos avançam em uma fase, a pontuação de corte será definida pelo ponto do 100º colocado.

Aliás, uma classificação final considerará a nota conquistada pela última pessoa classificada dentro da quantidade de vagas disponibilizadas. Ainda, o auditor fiscal Jeferson Rosa pontua que a nota de corte real também é calculada a partir do cumprimento dos requisitos da pontuação nominal citada acima, além de considerar a hierarquia dos maiores pontos.

“Por exemplo, se os 50 melhores em pontuação foram classificados e os demais forem automaticamente desclassificados, isso quer dizer que a nota de corte foi para 50 vagas”, ilustra.

“Em cada etapa de um concurso haverá um candidato que obteve uma pontuação menor, mas o suficiente para estar dentro das vagas para ser aprovado. Ou seja, a nota de corte não é um critério ou um objetivo em si, mas sim uma consequência de desempenho”, ressalta Willian.

Concursos que costumam ter notas maiores e menores

O nível de exigência de um certame é crucial na definição da nota. Nesse caso, os processos com um maior grau de dificuldade costumam ter uma pontuação menor, mesmo quando a concorrência possui uma boa qualificação.

“Geralmente, os concursos com mais disciplinas tendem a ter notas de cortes menores. O contrário também acontece. Quanto menor a quantidade de conteúdos, maior é a nota”, comenta Jeferson.

Além disso, o mentor cita a forma de cobrança das seleções, como as organizadas pelo Centro Brasileiro de Pesquisa em Avaliação e Seleção e de Promoção de Eventos (Cebraspe). Isso porque os certames planejados pela banca costumam ser compostos por um modelo de questões assertivas, onde uma questão errada anula uma correta.

“Os processos da Agência Brasileira de Inteligência e Polícia Federal tendem a ter notas de cortes baixas, devido ao modelo de cobrança”, aponta.

“Outro exemplo é o concurso de magistratura. Por possuir várias fases, muitos candidatos são desclassificados, reduzindo o número de habilitados finais. Nessa área, é comum não ter todo o quantitativo para preencher as vagas oferecidas. Então, sobram oportunidades”, cita.

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Conforme Willian, as seleções para a área fiscal, como o da Receita Federal, e para a de controle, como a de Tribunais de Contas, possuem pontos menores por serem mais dificultosas. Já os concursos para nível médio e com muitos inscritos podem ter notas maiores.

Mas ele ressalta: “Não há uma exata correlação e não acho que essa seja uma métrica válida para definir se o candidato faz ou não a prova”.

Em qual momento do concurso o candidato consegue consultar a nota de corte?

Por se tratar de um indicador capaz de definir os rumos dos concurseiros no processo – classificando e desclassificando candidatos –, muitos inscritos podem ficar na dúvida sobre quando é possível consultar a pontuação de corte.

Por depender das variáveis citadas acima, a nota de corte da prova de um concurso público só é divulgada pela banca responsável pelo certame após a conclusão da etapa, ou seja, quando a lista de classificados é publicada.

Apenas nesse momento é possível conhecer o ponto que foi determinado, com as notas de todos os participantes habilitados e a individual. Willian também cita que o indicador pode ser revelado, até mesmo, após a finalização do concurso.

Aliás, muitos candidatos podem pensar que a nota de corte serve como um parâmetro de desempate em uma avaliação. Mas, apesar de ser fundamental na habitação de uma fase, esse ponto não é usado em casos de empates.

“Os critérios de desempate são definidos pelo edital e podem incluir idade, maior nota em disciplinas específicas ou títulos. A nota de corte apenas delimita a classificação”, explica Willian.

Os efeitos da nota de corte nos candidatos

O preparo para uma prova de um concurso pode ser acompanhado por alguns sintomas de ansiedade, principalmente quando a data de sua realização se aproxima. Um estudo do Instituto de Psicologia do Controle do Stress (IPCS), e da Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC), destacou esse problema como reações associadas a uma preocupação excessiva, como a possibilidade de resultados negativos em uma avaliação.

Tentar “adivinhar” a nota de corte do processo também é algo que pode causar ansiedade no candidato, como aponta Willian. Ainda, esse comportamento pode atrapalhar a preparação para as etapas da seleção.

“Muitos usam a nota de corte de concursos anteriores para tentar prever a do atual. Mas isso pode ser frustrante e levar a conclusões equivocadas”, diz o professor. Isso porque cada certame possui as suas particularidades.

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Jeferson comenta que os participantes também são afetados quando não compreendem os critérios estabelecidos no processo e quando não possuem uma estratégia de execução de provas. “Assim, os requisitos acabam não sendo preenchidos para serem classificados.”

Melhores estratégias para alcançar a nota de corte de um concurso público

Segundo um levantamento realizado pela República em Dados, com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADc), o Brasil possuía 11,35 milhões de funcionários públicos em 2021. No mesmo ano, o número representava 12,20% do total de 91,18 milhões empregados.

Com isso, muitos brasileiros buscam construir as suas carreiras profissionais por meio de concursos públicos. Mas para alcançar a sonhada aprovação, é preciso adotar um bom planejamento de estudo, cuidar da saúde mental e compreender pontos importantes de um determinado edital.

Assim, vale seguir algumas estratégias para o candidato conseguir alcançar a nota de corte de uma forma mais eficiente, evitando também preocupações excessivas que possam causar ansiedade. Confira abaixo os quatro primeiros tópicos elencados por Willian e os demais listados por Jeferson:

  • Estude estrategicamente, focando no desempenho relativo, e não em uma nota absoluta;
  • Faça simulados realistas, priorizando as provas anteriores da banca organizadora;
  • Faça uma gestão emocional, evitando expectativas com base em notas de corte passadas;
  • Mantenha uma rotina equilibrada de estudos, revisões e resolução de questões;
  • Compreenda os critérios de avaliação do concurso, a partir da leitura do edital;
  • Entenda os critérios de desempate do concurso;
  • Compreenda a estrutura das provas;
  • Entenda a representatividade no resultado final de cada disciplina.

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