Por Vitória Prates
3 de Dezembro de 2024 às 07:30
2024 é o ano dos concursos. Com a estreia do Concurso Público Nacional Unificado (CNU), a área das seleções públicas atingiu um novo patamar. Grandes estatais, como o Dataprev, Correios e BNDES também abriram certames neste ano.
E as oportunidades não param por aí. O Censo dos Concursos Públicos de 2023, iniciativa realizada pelo Qconcursos, mostrou que, no ano passado, 10.000 certames foram abertos. Esse número representa um aumento de 200% em comparação com 2022.
O CNU pode ser uma iniciativa nova, mas já ganhou medalha de ouro no pódio dos concursos mais concorridos do Brasil, com 2,1 milhões de inscritos. Seguido pela seleção de 2023 do Banco do Brasil, com 1,5 milhões de candidatos.
Estabilidade financeira, plano de carreira e a possibilidade de crescer dentro do serviço público brilham os olhos dos concurseiros, mas o grande número de candidatos inscritos e a concorrência acirrada por vaga também assusta os futuros candidatos.
Objetivo, empenho nos estudos e boa organização fazem parte da receita do sucesso de um concurseiro. Para se inspirar com trajetórias de conquista dentro do serviço público, 6 servidores da Caixa Econômica, IBGE, INSS, Transpetro e juízes do Tribunal de Justiça de São Paulo e do Rio Grande do Sul, compartilham suas histórias.
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Ceres Danckwardt sempre quis ser juíza. Em 2019, realizou este sonho. A gaúcha foi aprovada no concurso para o Tribunal de Justiça de São Paulo, em 5º lugar. Ainda sim, ela lembra que, para atingir esse resultado, a trajetória foi longa.
Do Rio Grande do Sul a Alagoas, Ceres prestou concursos de magistratura estadual. Apesar de ser aprovada em 2019, por conta da pandemia, Ceres só tomou posse em 2021, e continuou prestando outros concursos no período.
O Direito sempre esteve no sangue. “Meus pais são delegados de polícia, mas, a vocação me chamou para a magistratura”, diz. “Eu via na carreira de juíza uma possibilidade de fazer justiça e melhorar a vida das pessoas. A magistratura exige muita responsabilidade. Nós temos que sair do nosso gabinete e dar uma resposta para sociedade, porque, como funcionários públicos, é isso que devemos fazer”.
Para ser aprovada, Ceres teve dedicação total aos estudos durante 3 anos. “A gente estuda, sem saber quando nosso momento vai chegar. Antes de sermos aprovados, passamos por várias reprovações”, relembra. “Para os candidatos, eu aconselho ter resiliência e confiar no seu método de estudo. Quando somos jovens, queremos o resultado quase imediato, mas ser aprovado é um projeto que leva tempo”, explica.
Segundo o Censo de Concursos Públicos de 2023, 54% dos candidatos se preparam por mais de um ano para as provas de certames, com concursos de alta concorrência, o tempo de preparo pode ser ainda maior. Nos estudos, Ceres selecionava uma disciplina e seguia o seguinte método de estudo:
“Sempre esgotava um tópico antes de passar para o próximo. Se fosse uma matéria rápida, eu conseguia fazer todos os processos em um dia, mas, às vezes, podia levar até uma semana”, explica. Mesmo trabalhando no TJSP, Ceres continuou prestando para o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, ela voltou para casa no ano passado, aprovada em 1º lugar no certame.
“Nós, concurseiros, sempre dizemos ‘é melhor ser aprovado em último lugar nesse concurso do que em primeiro no próximo’. Reprovei no Rio Grande do Sul, e no seguinte fui aprovada em primeiro lugar”, conta. “Foi uma grande honra ter sido aprovada nessa colocação no meu estado. Na posse, pude discursar no Plenário, representando meus colegas, uma grande honra. Tem um gostinho especial de ser em casa”.
“Mas, a aprovação em São Paulo, não passa longe da emoção. O Tribunal de São Paulo é um dos maiores do mundo, super respeitado. Até ser aprovada em São Paulo, eu não sabia que um dia seria aprovada. No dia que a gente descobre ‘Vou ser juíza’ a sensação é inexplicável”, afirma Ceres.
Entre audiências e trabalho em gabinete, daqui a 5 anos, Ceres quer voltar a ser juíza titular. Em São Paulo, a gaúcha foi promovida e trabalhou na função por 6 meses, mas, com a aprovação no TJRS, voltou a ser juíza substituta. “Como titular, acompanhamos os frutos do nosso trabalho, do início ao fim do processo. Acredito que logo estarei como juíza titular aqui, e já estou ansiosa para que isso aconteça”, afirma.
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Natural de Santa Cruz do Rio Pardo, no interior de São Paulo, Caio Hunnicut realizou o sonho de ser juiz neste ano. Em julho, ele foi aprovado em 1º lugar no certame para o Tribunal de Justiça de São Paulo. Quando o resultado chegou, Caio conta que demorou para cair a ficha. “Esse momento está sendo muito especial. Bate o nervosismo, mas é uma sensação de sonho realizado”, diz.
Para quem também tem o desejo de seguir carreira na Magistratura, Caio diz que vale a pena o esforço. Antes do tão sonhado “sim”, Caio recebeu vários “não”, até chegar no TJSP, o paulista foi reprovado em outros 10 concursos. Assim como Ceres, Caio encarava o momento de estudos como uma jornada de trabalho.
Recém-formado na USP, trabalhou durante 3 anos em um escritório de advocacia, juntando dinheiro para poder dedicar-se integralmente à preparação do concurso. Para os próximos candidatos, Caio indica ter dedicação e aceitar que não existe uma “fórmula mágica” para aprovação: “Cada concurseiro tem seu estilo de estudo e tempo. No mundo dos concursos, muitas pessoas vendem um sonho impossível ‘use meu método e seja aprovado’, nem sempre isso dá certo”, defende.
“Acabei de me formar do curso da Escola de Magistratura, das 100 pessoas ali, cada uma seguiu uma forma de estudar e foi aprovada em um tempo. Todas são experiências válidas, são muitos caminhos para o mesmo destino”.
A faísca que levou Sidnei Lima ao serviço público o atingiu durante a graduação. Enquanto se formava em Administração de Empresas, pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), Sidnei fez estágio em uma estatal e pôde conhecer o setor público de perto, com propósito que o encantou.
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“Diferente dos outros setores, o setor público impacta diretamente a vida da sociedade. Enquanto outros buscam, exclusivamente, resultados financeiros, aqui também temos compromisso com a justiça social e a melhora da qualidade de vida”, afirma. “Para o profissional também é um ambiente muito rico, com grande chance de crescimento”.
Inspirado nessa experiência, Sidnei começou a estudar para concursos públicos, com foco em instituições financeiras. Foi aprovado para bancário na Caixa Econômica, e já se vão 18 anos de história. Hoje, Sidnei trabalha na área de Planejamento Financeiro, em uma rotina, como ele descreve, dinâmica e desafiadora.
“Cada cliente tem uma situação financeira única, é preciso entender as realidades para fornecer as melhores soluções. Além disso, é necessário estar sempre de olho no mercado, economia e mudanças regulamentares. É um trabalho que mescla conhecimentos técnicos e habilidades interpessoais”, explica.
Sidnei foi aprovado no concurso de 2006. Mas, para conseguir a tão sonhada aprovação, o trabalho começou 2 anos antes, e algumas estratégias de estudo o ajudaram no processo. “Eu analisava o conteúdo do edital. A partir daí, montava um cronograma realista e dividia as matérias em tempo de estudo até a data da prova”, explica.
O servidor aconselha priorizar as disciplinas com maior peso, mas sem deixar de lado as demais. Outra dica que ele compartilha é: faça simulados. “A resolução de exercícios ajuda a fixar melhor o conteúdo e a entender o estilo de prova”. Mesmo com muito estudo, Sidnei diz que a saúde mental não pode ser deixada de lado.
“A alta competitividade entre os candidatos e a dificuldade de se destacar entre eles é um desafio. A preparação exige não só o domínio de um vasto conteúdo, mas também maneiras de conciliar os estudos com outras responsabilidades, como trabalho e família. Tem momentos em que tudo parece muito difícil, mas, a cada dia de estudo, a sua aprovação está mais perto”, argumenta.
Da área administrativa para os Recursos Humanos, Juliana Horta tem 17 anos de serviço público na Transpetro. Entre reuniões e tomadas de decisão, Juliana tem como pauta o desenvolvimento humano e social dos outros servidores da instituição.
Logo após formar-se na faculdade, Juliana pesou seus próximos passos profissionais, dois fatores contribuíram para sua decisão de prestar concurso público: estabilidade financeira e trabalhar em uma empresa de impacto. Assim, Juliana começou a estudar para os certames da Petrobras e da Transpetro.
Maior subsidiária da Petrobras, a Transpetro é responsável pela logística terrestre e marítima de transporte de petróleo, gás e biocombustíveis, com atuação nacional e internacional. Em 2007, Juliana foi aprovada no certame e entrou na estatal.
Hoje, ela, da sede do Rio de Janeiro, ocupa o cargo de gerente executiva de RH. "Sempre que falo com os novos servidores, me vem um filme na cabeça. Eu também fui novata, há 17 anos. E hoje, em uma posição de destaque no RH, é muito gratificante saber que eu posso contribuir mais para que a empresa seja um agente transformador da sociedade".
No preparo para concursos, Juliana cita duas dicas principais: conhecimento e equilbrío mental. O que ajudou Juliana nos estudos foi fazer outros concursos no processo. "Fazer outras provas te ajuda a se acostumar com o ambiente. Reduz os riscos de ficar nervoso ao extremo", aconselha.
Na hora dos estudos, Juliana se organizou por conta própria, durante 2 anos. "Foquei no que eu tinha mais afinidade. Ninguem é bom em tudo, então eu priorizava as matérias que eu sabia que iam me dar mais retorno". No processo, como ela conta, fez questão de continuar trabalhando e mantendo a vida social ativa. "A longo prazo, abrir mão de aspectos importante não é sustentável", diz.
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"A consistência nos estudos é muito importante, mas não deixe a vida inteira ficar por conta do concurso, para não ter um desiquilíbrio", afirma ela.
A história de Gustavo Beirão com o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) começa muito antes da sua aprovação. Sua mãe, Iraildes, também foi servidora pública da instituição, na área de Recursos Humanos.
Quando criança, Gustavo passava a tarde no trabalho com a mãe, brincando, como relembra, na máquina de datilografia. Seu contato com o INSS começou na afetividade e, aos 18 anos, também tornou-se um trabalho. “Bem em 12 de junho de 1995, dia dos namorados. Eu brinco que aí começou o caso de amor”, diz.
De 1995 a 2003, Gustavo atuou como técnico autônomo, terceirizado para instituição. Passou pela área de revisão de benefícios rurais ao atendimento ao público, em Agências da Previdência Social, em Salvador, e no Prevfone (atual Central 135) como supervisor de atendimento.
Nessa época, o INSS lançou concurso público para técnicos e analistas, Gustavo se inscreveu para ambos os cargos, e foi aprovado nos dois. Em 2005, ele foi convidado a atuar no projeto de implementação do novo modelo de gestão do INSS. De Salvador, Gustavo mudou-se para Brasília.
O baiano foi para Brasília passar dois anos, e já se vão 20 na cidade. Nesse período, atuou na assessoria de comunicação social, dentro da presidência do INSS. Desde o ano passado, Gustavo é presidente da 2ª Composição Adjunta da 5ª Junta do Conselho de Recursos da Previdência Social.
“Já são 21 anos como servidor público do INSS. E, se contar a trajetória antes de ser concursado, são mais de 30 anos de previdência social”, diz. E a trajetória profissional de Gustavo não acaba por aí. Formado em Publicidade e Propaganda e em Direito, ele também é autor de livros sobre Direito Previdenciário, e professor universitário.
Durante a preparação, Gustavo se considera privilegiado. “Na época que prestei o concurso, eu já trabalhava há anos com a maioria dos assuntos que caíram da prova. Estar lá dentro foi um facilitador para os estudos”, conta. Mas, para os próximos concurseiros, Gustavo dá algumas dicas:
Entre os atrativos do serviço público, Gustavo lista a estabilidade, o salário justo e a missão do trabalho. “Serviço público: o próprio nome já diz, o propósito é servir a população. Muitas pessoas têm, na previdência social, a única fonte de renda. Por meio do serviço público ampliamos a proteção social e fazemos justiça”, diz.
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Para Gustavo, o futuro do serviço público é promissor. “A gente que trabalha com direito social sempre é otimista. Espero que os órgãos da área sejam integrados, em um fórum interinstitucional; que a força de trabalho seja reforçada; evolução da tecnologia e implantação de uma cultura previdenciária no país”, diz.
Em 2024, Eric Daniele completou 10 anos de Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O cientista social já passou por diversos projetos na estatal, e hoje atua como Coordenador Administrativo, em São Paulo. Assim como Gustavo, a história de Eric com o instituto onde trabalha, começou antes da aprovação.
Recém-formado na USP, em 2008, enquanto atuava como assistente de pesquisa no Núcleo de Políticas Públicas da universidade, foi convidado a realizar um curso na sede do IBGE, no Rio de Janeiro. Com a experiência de formação positiva, Eric se inscreveu para o Censo Demográfico de 2010, aprovado para o cargo de supervisor temporário.
“Muitos concurseiros só leem 3 coisas no edital: o salário, o conteúdo e a data da prova. Poucos se atentam às atribuições da vaga. Isso gera servidores pouco satisfeitos, pois muitos acabam não gostando das funções da vaga que se inscreveram”, afirma. Ele continua: “Comigo foi diferente. Eu tive a oportunidade de conhecer o IBGE antes de estar aqui como efetivo, e senti vontade de entrar na estatal porque gostei do trabalho realizado”.
Na sua trajetória profissional, Eric passou de office boy na adolescência até professor de sociologia. Quando decidiu seguir pela carreira pública, Eric prestou diversos concursos, como Metrô de São Paulo, SPPrev, UNESP, Câmara Municipal de São Paulo, Ministério do Meio Ambiente e Petrobras. Mas o foco maior para aprovação era na Secretaria de Educação e para o IBGE.
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As duas provas, na época, foram separadas por um período de 15 dias. “Eu só pensava: ‘Em alguma dessas eu preciso passar’’, conta. Um conselho de um professor do cursinho, antes de entrar na universidade, marcou Eric: “Ele dizia: para você ser aprovado, você tem que ter 3 coisas: conhecimento, autoconfiança e técnica de prova. Essa dica era para vestibular, mas vale para concursos públicos também”.
A técnica de prova diz respeito ao treino. Para Eric, enquanto se estuda para concursos, é importante ir prestando certames. “Tem que virar quase uma rotina, como um concurso a cada 3 meses. Só estudar não adianta. As bancas são diferentes, o tempo de prova, conteúdos cobrados, é importante sempre fazer concursos”, diz.
Antes da tão sonhada aprovação, há muitas negativas. Para os concurseiros, Eric indica não esquecer os erros. “Quando você não é aprovado, pegue a prova e veja onde você errou. A chance de alguma outra banca fazer uma pergunta do mesmo conteúdo é alta. Errar hoje, não significa errar amanhã”, afirma.
O esforço foi recompensado: Eric foi aprovado em 1º lugar no IBGE e em 2º para professor efetivo. Na época, a concorrência para o certame do IBGE chamou sua atenção. “Eram 300 vagas, o que parece muito. Mas, quando você vai se inscrever, é preciso escolher a cidade. Na prática, acaba sendo 1 vaga para cada lugar”, explica.
O IBGE foi destaque do Concurso Público Nacional Unificado (CNU) deste ano. Através do certame, o instituto realizou seu maior processo seletivo da história, com 895 vagas. Na relação candidato/vaga, o IBGE também teve o cargo mais concorrido da seleção, para Analista, com especialização em Engenharia Civil, com 28.534 inscritos para uma vaga.
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Para Eric, o trabalho no instituto não oferece zona de conforto. “É uma rotina super dinâmica. Às vezes nos punimos por ter muita coisa para fazer, mas poucos servidores, mas os desafios que o IBGE propõe são sempre motivadores”, pontua.
Para os que pensam em seguir a carreira, Eric diz: vale a pena. “O trabalho é uma missão pública. Muitos brasileiros precisam da gente. Meu pai sempre falava: ‘Estuda, não seja peão igual seu pai’, linguajar popular, mas que traz uma carga de ‘Se esforça que você vai conseguir’”.
Essa nova onda de servidores do IBGE, com o CNU, é esperada ansiosamente por Eric. “Serão todos bem-vindos. Que sejam pessoas abertas a desafios, e que queiram construir o futuro das instituições. As instituições não são monolíticas, mas vivas. O serviço público tem sim amarras burocráticas, mas também dá para aproveitar o espaço para inovar”, pontua.
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