Por Jennifer de Carvalho
27 de Dezembro de 2024 às 10:00
O fim da escala 6x1 – ou seja, seis dias de trabalho e um de descanso – tem ganhado bastante repercussão nas redes sociais recentemente. A proposta também foi o tema de manifestações contra o modelo em muitas capitais do Brasil, nas quais ocorreram, principalmente, no dia 15 de novembro.
A carga de 44 horas por semana é distribuída nesse regime 6x1. Isso porque, conforme a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), esse é o período que não pode ser ultrapassado, bem como a duração do trabalho não pode ser superior a 8 horas por dia. Mas quando se trata de servidores contratados por meio de concursos públicos, os funcionários podem realizar essa escala?
Antes de entender se o 6x1 existe para concursados, vale compreender a proposta sobre o término desse modelo. Conforme o texto de autoria da deputada federal Érika Hilton (PSOL-SP), uma das justificativas para essa discussão é de que esse tipo de carga “afeta negativamente a qualidade de vida dos empregados, comprometendo sua saúde, bem-estar e relações familiares”.
Ainda, o documento sugere uma análise sobre a redução da jornada de trabalho para a escala 4x3 – ou seja, quatro dias trabalhados, seguido por três dias de descanso. Para a proposta de emenda à Constituição (PEC) ser protocolada na Câmara dos Deputados, ela precisa atingir, ao menos, 171 assinaturas.
Em uma coletiva realizada no dia 13 de novembro, compartilhada pela deputada no seu perfil oficial no Instagram, Érika disse que o texto já tinha a quantidade de assinaturas necessárias, mas ainda estava fazendo a coleta de outras.
Além disso, a PEC 221/19, do deputado Reginaldo Lopes (PT-MG), está em tramitação na Câmara e aborda a redução da jornada semanal de trabalho de 44 para 36 horas.
Advogada especialista em direito administrativo, Luanda Naiara explica que como qualquer legislação relacionada ao servidor público se refere ao Estatuto do Servidor, as normas sobre a CLT não causam muito impacto, pois são diferentes. Aliás, ela lembra que cada Estado e Município possuem o seu próprio Estatuto.
Rogério de Castro, advogado especialista em concursos públicos e servidores, e Juciane Santos de Sousa, advogada especialista em concursos públicos, destacam que a escala 6x1 para concursados realmente não é um padrão. Porém, é possível encontrar casos em que o modelo pode ser aplicado em algumas áreas específicas, como atividades contínuas ou de plantão.
Mas quando isso acontece, é preciso existir uma norma específica e bem transparente. “Nessas situações, essa escala deve estar prevista na legislação, no regulamento interno do órgão ou no edital do concurso público”, ressalta Rogério.
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A Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, é voltada para o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais.
Assim, o Art. 19 consta que esses funcionários devem cumprir uma jornada de trabalho fixada, respeitando a duração máxima de trabalho semanal de 40 horas. Ainda, é descrito no artigo que também devem ser observados o limite mínimo diário de 6 horas e o máximo de 8 horas.
Além disso, o Art. 74 destaca a permissão de um serviço extraordinário para o atendimento de situações excepcionais e temporárias, desde que seja respeitado o limite máximo de 2 horas por jornada.
Mas vale destacar que o Supremo Tribunal Federal (STF) flexibilizou o regime de contratação de servidores. Em nota publicada no dia 6 de novembro, foi declarada a possibilidade dos órgãos públicos realizarem contratações pela CLT, além dos regimes jurídicos únicos (RJU).
Ainda, o STF citou que, nesse caso, o texto original do artigo 39 da Constituição Federal de 1988 previa que cada ente da federação – ou seja, União, Estados, Distrito Federal e Municípios – deveria instituir o seu regime jurídico único e os planos de carreira para os funcionários.
Juciane lembra que a decisão do STF e a pauta sobre o fim da escala 6x1 podem causar alguns efeitos. “Dependendo do modelo de contratação do servidor público e, se a proposta for aprovada, podem ser necessárias algumas adequações que os contratados pela CLT precisarão observar”, ressalta, sobre um possível cenário do término dessa jornada.
Ao se interessar por um concurso público, é importante que a pessoa analise e estude o edital. Isso porque o documento conta com informações importantes, que vão além das datas das provas. Um ponto que o candidato precisa se atentar é justamente sobre a jornada de trabalho do cargo desejado.
“Quando alguém se inscreve em um concurso público, geralmente não costuma ter a escala, mas sim a carga horária. Nesse caso, pode conter a informação de 20, 30 ou 40 horas semanais. Algumas vezes, quando tem 24 horas, é para plantonista”, diz Luanda.
Ainda, Juciane comenta a necessidade do candidato avaliar o estatuto da função no qual pretende concorrer. “O edital também pode ter, ao menos, as Leis que regem o cargo em específico. Geralmente, esses detalhes ficam na introdução do documento.”
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No geral, os certames precisam destacar a jornada de trabalho para que a pessoa avalie se será viável ou não prestar determinado concurso. “A ausência dessa informação pode ser questionada administrativa ou judicialmente, por se tratar de uma falha que compromete a transparência do certame”, comenta Rogério.
Aliás, o advogado cita três maneiras para o concurseiro pesquisar mais a fundo sobre a carga horária da função de interesse. Confira:
As escalas de um servidor concursado depende muito do estatuto de um Estado ou de um Município, além das atribuições da ocupação. Com isso, os modelos são bastante variáveis, pois dependem do regime jurídico e da legislação prevista.
Juciane comenta que na Paraíba, por exemplo, o estatuto dos servidores estabelece uma carga horária de 44 horas semanais, a partir do limite diário entre 6 e 8 horas. Assim, o período é distribuído em 8 horas por dia, com meio expediente aos sábados.
Vale citar outros casos, como o concurso público de Volta Redonda, no Rio de Janeiro, voltado para a Secretaria Municipal de Educação. Conforme o seu edital, os cargos de Agente Escolar e Porteiro contam com uma jornada de 44 horas por semana. Nesta matéria, é possível conferir mais detalhes sobre o processo.
Ainda, a Prefeitura de São Joaquim de Bicas, em Minas Gerais, lançou o edital de seu concurso, em que um dos anexos destacou uma carga de 44 horas por semana para a função de Operador de Máquina Pesada. Para saber mais sobre a seleção, confira esta matéria.
Com esse cenário, ao falar sobre as escalas existentes mais comuns para concursados e como elas funcionam, Rogério elabora a seguinte lista:
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“Pode acontecer, por exemplo, da pessoa que fez o concurso trabalhar em uma escola em São Paulo e, depois, fazer uma matrícula em outra. Então ela atua vinte horas por dia em um e vinte horas por dia em outro. Nesse caso, não significa que o modelo seja de oitenta horas, pois há uma combinação de duas jornadas”, exemplifica Luanda.
Caso o trabalhador sinta que algo não está dentro da lei, é possível fazer essa identificação seguindo alguns passos. Segundo Rogério, o primeiro é comparar a legislação com o certame. “Verifique se o que está sendo praticado no órgão está de acordo com o previsto no edital, na legislação ou no regulamento do cargo”, orienta.
Depois, vale fazer uma pesquisa sobre os direitos básicos, como descanso semanal, período de pausa durante o expediente e os limites de horas semanais que devem ser respeitados. Nos casos de maiores dúvidas, ele indica a consulta com uma assessoria jurídica, como a busca por um advogado de confiança do trabalhador.
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Se o órgão no qual o servidor atua exigir uma jornada fora da legislação, Juciane fala sobre a importância de montar um requerimento justificado e protocolar na repartição pública, para que seja aberto um processo administrativo. “Se, ainda assim, não ocorrer uma adequação, é possível ingressar com o pedido judicial”, ela diz.
Ainda, Rogério complementa que o funcionário público pode seguir as seguintes etapas:
Algo que Luanda lembra é sobre os desafios que podem surgir no meio de um procedimento como esse, relacionado ao órgão em que a pessoa trabalha. “Isso pode ser difícil, pois quem faz a legislação é o próprio município, por exemplo. Então, se um prefeito quiser que o servidor trabalhe em outro horário, ele cria um regulamento. Não precisa nem ser lei, pode ser um decreto.”
“O que o servidor não pode é trabalhar menos ou mais da quantidade de horas. Se tiver abuso de autoridade sobre a exigência de uma carga que não existe, o município pode ser processado, mas é possível que o prefeito crie uma lei para resolver o problema”, ela comenta.
Mas ao buscar a garantia de seus direitos em relação às escalas, o servidor pode agir da seguinte maneira, segundo Rogério:
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