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Passou no concurso de outro estado? Veja como se planejar para essa jornada

Confira as experiências e os desafios de quatro concursados que se mudaram para outros estados, após serem convocados para tomar a posse de um cargo

jennifercarvalho033@gmail.com

11 de Junho de 2025 às 08:27

Ao se inscrever em um concurso para outra região, é importante que o candidato organize a sua vida financeira e pessoal - Foto: Adobe Stock

Passar em um concurso público e tomar posse de um cargo desejado representa uma grande conquista. Essa experiência é capaz de transformar vidas, tanto na área profissional quanto pessoal. Muitos concurseiros conseguem se tornar servidores públicos na sua própria cidade, por exemplo. No entanto, quando esse sonho se encontra em outro estado, a vivência pode ser bem diferente – já que exige outros tipos de mudanças.

Conforme um levantamento realizado pela República em Dados, com base na Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), o total de servidores públicos estaduais em 2020 era de 3.537.440. Em 1995, por exemplo, esse número era de 2.929.817 funcionários.

Considerando esse cenário, muitos candidatos foram selecionados para trabalhar no próprio estado onde moravam. Enquanto outros precisaram se planejar para mudar de um estado para outro.

Natural do estado São Paulo, Felipe Costa – também conhecido como Goiaba no mundo dos concurseiros – saiu da cidade de Santo André para embarcar em uma nova jornada. O seu desejo era conquistar o cargo de auditor fiscal.

“Passei nos concursos da Secretaria de Fazenda do Pará (SEFA), Secretaria de Estado da Fazenda do Amazonas (SEFAZ), SEFAZ de Minas Gerais, Secretaria Municipal de Fazenda de Belo Horizonte (SEMFA) e a SEFAZ de Mato Grosso”, relembra.

Felipe Costa, fiscal de receitas estaduais na Secretaria de Fazenda do Estado do Pará. – Foto: Arquivo Pessoal

Como se pode observar, as suas aprovações ficaram bem distantes de São Paulo e, como ele próprio comenta, em regiões brasileiras bem distintas umas das outras. Após uma caminhada repleta de desafios, tomada de decisões e experiências memoráveis, atualmente Felipe ocupa o cargo de fiscal de receitas estaduais na Secretaria de Fazenda do Estado do Pará.

Me interessei por um concurso em outro estado: quais são os primeiros passos para me planejar?

Ao encontrar o edital de um concurso em que a função almejada conta com uma atuação em um estado diferente, o interessado deve considerar diversas questões antes de se dedicar aos estudos do processo. Por exemplo, é necessário compreender como será a rotina de aprendizado, entender a realidade financeira e alinhar as expectativas com a família e pessoas próximas.

Mestre em Enfermagem e sócia-proprietária da Cadernos de Estudos Digitais, Lídia Rocha destaca que uma leitura aprofundada do edital é um dos primeiros passos. Para ela, o documento é como se fosse um manual. “Saber os detalhes do certame será muito importante, pois, dessa forma, a pessoa conseguirá identificar a sua disponibilidade pessoal para se deslocar de um estado para o outro, para realizar a prova.”

Leia também sobre como se preparar para um concurso público nesta reportagem.

Ao consultar o edital, pesquise sobre os requisitos para assumir o cargo, além das datas de inscrição, provas e o dia previsto para a divulgação dos locais da realização dos exames. Aliás, nesse último caso, vale procurar se a publicação informa as possíveis cidades onde as avaliações serão aplicadas.

Assim, Lídia comenta que essas verificações podem ajudar o candidato a buscar o conhecimento sobre os custos médios de passagem e hospedagem que ele precisará desembolsar para participar da seleção.

Natural de Teresina, no Piauí, a nutricionista Nayara Monteiro trabalha na Prefeitura de Fortaleza. Ela atua na Fundação de Apoio à Gestão Integrada em Saúde da cidade (FAGIFOR) e mora na capital do Ceará há nove meses.

Ela explica que uma de suas estratégias ao realizar seleções de outras regiões é escolher estados próximos de sua terra natal. “Ainda, eu vejo a viabilidade de mudança e habitação naquele local. Também avalio as condições de trabalho, como, por exemplo, a carga horária, o possível órgão de lotação e o salário, além de avaliar os gastos com moradia e transporte”. Para ela, esses pontos são essenciais para norteá-la em relação a um possível deslocamento.

“Como sou do Piauí, costumo ficar entre concursos no Ceará e Maranhão. Esse é um tópico que avalio muito, principalmente, pela minha família”, ressalta.

Atualmente, Nayara também está aguardando a convocação do concurso público do Instituto Federal na Bahia (IFBA), de 2022. “Esse foi o único que fiz mais distante. Inclusive, nem achei que conseguiria a aprovação. Acredito que, muitas vezes, arriscamos fazer uma prova em outro estado, sonhamos em morar lá, mas quando acontece a aprovação tudo se torna uma surpresa.”

Posso prestar um concurso em outro estado?

Para quem deseja prestar um concurso de outro estado e tiver dúvidas se pode ou não se aplicar, a resposta é sim. Os brasileiros podem realizar provas de processos de qualquer região. Basta preencher todos os requisitos para o ingresso no serviço público.

“Existem concursos que, após a aprovação e a posse, exigem que a pessoa tenha um domicílio no lugar onde ela exercerá o cargo. Mas isso é depois. Durante a prestação do processo a pessoa pode morar onde quiser”, diz Laura Amorim, especialista em aprendizagem e preparação para concursos.

Aliás, Raquel Medeiros, consultora educacional e pedagoga pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), lembra da importância em prestar atenção na abrangência geográfica do cargo.

“Por exemplo, concursos estaduais podem ter vários postos de trabalho, em diferentes cidades. Dependendo da classificação do candidato, ele pode ser alocado em um município diferente do que pensou inicialmente. É preciso estar pronto para lidar com esse tipo de imprevisto.”

Lídia complementa que as seleções federais, por exemplo, costumam aplicar as suas provas em todas as capitais, como o Concurso Nacional Unificado (CNU) e o processo da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh). Nesses casos, o candidato pode fazer, pelo menos, a avaliação em seu próprio estado.

Organização da vida pessoal: os relatos de quem passou pela experiência

A vida pessoal é uma das preocupações principais dos concurseiros que se preparam para um certame de outro estado. Nesse caso, a organização também depende da realidade de cada um. Além disso, ter uma rede de apoio pode facilitar esse processo de grandes mudanças.

Enfermeira pediátrica no Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Núbia Maria Saldanha Vieira Alves se mudou de Fortaleza, no Ceará, para Curitiba. A sua nova vida e a de sua família iniciou após ela passar no concurso da Ebserh. Porém, como a convocação demorou quase um ano, ela usou esse período para se planejar.

“Tive bastante tempo para vender ou doar os meus pertences de casa, deixando só o necessário mesmo. Também comuniquei a locatária da moradia que iria devolvê-la e deixá-la pronta para entrega”, ela comenta.

Núbia destaca o apoio recebido, pois foi no lar de familiares que ela passou um período, quando a data da chamada dos aprovados estava mais próxima. Enquanto isso, o seu esposo, que também era concursado da Ebserh como técnico de enfermagem no Ceará, desde 2014, buscava informações sobre a realização de uma transferência por cônjuge. Ela comenta que essa é uma opção fornecida pela Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares aos seus funcionários.

“No meu trabalho da época eu era concursada do próprio estado. Com isso, a minha chefia já estava ciente da minha ida a qualquer momento, porém só poderia pedir demissão quando fosse realmente convocada”, lembra.

Na ocasião, o seu filho mais velho tinha 6 anos. Para ele, foi comunicado a mudança de escola, enquanto os pais pesquisavam unidades no Paraná que tivessem o mesmo método de ensino. A ideia era que o pequeno não sentisse tanta diferença nesse processo.

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Já em São Paulo, o auditor fiscal Felipe considerou a grande concorrência pelo cargo desejado, o que possibilitava uma aprovação em outro estado. Assim, ele conversou com a sua companheira e a sua família sobre as chances de uma mudança.

“É uma decisão que envolve diversas pessoas em seu entorno. No entanto, grande parte das decisões e da reorganização da vida pessoal surge mesmo após a confirmação da aprovação, com o seu nome no Diário Oficial. Antes disso, você se imagina morando no local em que foi prestar a prova e como seria a vida naquele lugar, mas nada muito além disso”, comenta.

Joyce Katiane Lima, técnica em enfermagem na Secretaria de Saúde do Distrito Federal (SES-DF), sempre almejou o cargo que ocupa atualmente. “No meu estado, no Rio Grande do Norte, não tinha tantas possibilidades”, diz.

O primeiro canto de estudos de Joyce, enquanto se preparava para alguns concursos. Foto: Arquivo Pessoal

Ela se mudou para Brasília em março, mas já conhecia o local. “Por ser um lugar com muitos concursos, eu comecei a organizar os meus estudos para que eu pudesse vir para cá. Então, todo o meu trabalho e o do meu marido era voltado para isso, como custos de viagens para fazer provas”, relata Joyce. Assim, ela chegou a ser aprovada em três avaliações.

Quais são os gastos e as outras preocupações a serem considerados quando um concurso é voltado para outro estado?

O regime estatuário se refere ao vínculo entre servidores públicos e a administração pública. Quando se trata dessa relação, o estado de São Paulo possui a maior quantidade, com uma proporção de 376.420. Já Roraima é o que conta com a menor taxa, 14.399. Os índices são da República em Dados, baseados na Pesquisa de Informações Básicas Estaduais (ESTADIC) de 2021.

Com esse cenário, ao estudar para um concurso de outro estado é preciso considerar diversos gastos que podem surgir nesse período. Além da taxa de inscrição, o candidato precisa levar em conta os custos com os materiais de apoio e o deslocamento para a realização da prova. Nesse último caso, registre a média de gastos básicos, como passagens e hospedagens – se for necessário –, além de incluir a alimentação.

“É importante pensar no transporte e analisar se o concurso possui várias etapas a serem aplicadas em dias diferentes”, aponta Laura. “Por exemplo, pode ser que a avaliação objetiva ocorra no mês de abril e a discursiva em junho. Com isso, será preciso se deslocar duas vezes”, ilustra.

Enquanto isso, os participantes precisam se preocupar com outro ponto essencial: a mudança para outro local, ao serem convocados. Essa etapa também envolve muitos gastos, além da necessidade de pesquisar por moradias. Aliás, conforme as especialistas, na maioria dos casos, os custos com essa transição ficam por conta do próprio servidor.

“Alguns órgãos ou empresas públicas podem oferecer benefícios, como o auxílio-moradia. Mas isso depende do edital e da política interna da instituição. Ou seja, os custos iniciais ainda ficam por conta do candidato”, destaca Raquel. “Ainda, outros órgãos têm programas de incentivo ou relocação, em caso de cargos estratégicos ou regiões de difícil acesso.”

Por isso, é importante analisar todos os detalhes do certame, para compreender se a instituição possui ou não algum tipo de apoio relacionado à troca de domicílio. Essa informação também guiará a organização do participante.

Mesmo assim, Raquel indica a criação de um “fundo concurso”. Essa estratégia consiste em um planejamento financeiro com uma reserva emergencial para os próximos meses. “Destine um valor mensal para cobrir os custos iniciais, independente se o órgão oferecer incentivos porque, normalmente, eles são voltados apenas aos servidores e não cobrem a mudança em si”, explica.

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Mariana Oliveira, mentora de concursos públicos e fundadora da Consult Concursos, fala sobre a necessidade do aprovado implementar algumas dicas ao longo da fase em que ele assumirá um cargo público em outro estado:

Além disso, Lídia cita alguns fatores que podem ser pensados bem antes de todo o procedimento de deslocamento. Para ela, as seguintes ponderações podem auxiliar na decisão se realmente vale a pena fazer a inscrição no concurso e realizar a sua prova:

O processo da mudança

Ao saber de sua aprovação e ser convocada, Nayara sentiu uma mistura de alegria e susto. Ela não esperava que o resultado sairia tão rápido. O medo de algo novo gerou dúvidas e inseguranças por dias. “Pensei se iria realmente assumir, porque seria a primeira vez morando sozinha e longe da minha família”, conta.

Mas depois de muita reflexão, ela decidiu enfrentar o desafio. O processo de mudança, por exemplo, não foi muito fácil. “Tudo já começou na apresentação dos documentos, pois isso envolve gastos com transporte, alimentação, hospedagem e locomoção. Nesse caso, o prazo entre a entrega dos itens e o início do trabalho foi de menos de um mês”.

Esse período deixou as coisas um pouco mais corridas. A nutricionista precisou pensar na viagem da mudança para o Ceará, pesquisar casas e apartamentos, decidir se iria ou não para um lar já mobiliado, além de considerar a sua segurança. “A preocupação com o local, que fosse seguro para uma mulher morar sozinha, foi muito intensa”, diz.

Nayara Monteiro, nutricionista na Prefeitura de Fortaleza, no Ceará. Foto: Arquivo Pessoal

“Hoje, me orgulho do que venho trilhando, dos desafios superados e da pessoa que estou me tornando. Não é fácil. Mas, para mim, tem sido necessário para crescer e evoluir como pessoa e profissional. Costumo acreditar que se essa oportunidade veio até mim, é porque eu preciso agarrá-la. E nada melhor do que assumir um concurso, ter estabilidade e uma vida totalmente nova”, reflete Nayara.

Enquanto isso, Joyce passou cerca de 15 dias na casa da família de um primo de seu esposo, localizada em Brasília. Mas antes disso, chegou a pensar em não se mudar. “Eu estava esperando outras nomeações, mas como seria o primeiro cargo, decidi vir”, comenta.

O início da sua nova fase foi difícil porque não conhecia quase ninguém. Foi com a indicação de uma colega que ela conseguiu encontrar o apartamento onde mora atualmente. A partir disso, a sua adaptação para trabalhar em outro estado foi bem leve. “O difícil mesmo foi me acostumar com o clima, que é bem diferente de Natal.”

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Do outro lado do mapa, no Paraná, Núbia acha maravilhoso viver em Curitiba – embora ela continue amando Fortaleza. “Aqui, a capital tem cara de interior, no sentido de uma vida mais pacata e tranquila, com muito verde, sem muitos casos de violência e trânsito”, descreve.

Mas o processo de mudança em 2019 teve muitos desafios. Um deles foi ficar um tempo longe de seu esposo e de seus dois filhos. Depois, levou um susto com o departamento de Recursos Humanos (RH). “Eles tinham informações desatualizadas, de que eu não poderia assumir, pois tinha um segundo vínculo. Porém, esse regimento foi modificado no ano anterior, mas quase não consegui fazer o meu admissional”, relata.

Ao pesquisar por moradia, Núbia lembra que encontrou muitas burocracias para o aluguel, além de valores altos. Mas apesar de tudo, conseguiu a sua casa. Ainda, como a cidade de Curitiba possui um clima bem diferente de Fortaleza, o frio foi outro problema. “Tive muitas crises de rinite, noites mal dormidas e dores musculares. Além disso, precisei aprender a me vestir no frio e a evitar as doenças relacionadas.”

De São Paulo para o Pará, Felipe ressaltou o choque cultural que teve ao se mudar. Ainda, outro desafio foi encontrar um local adequado e seguro próximo ao trabalho. “O lado bom é que outras pessoas ao seu redor, que também foram aprovadas, passam por esse mesmo processo. Então, os vínculos se tornam mais fortes e duradouros”, conta.

Aliás, a sua fase de adaptação está sendo melhor do que esperava. Ele fala sobre como a culinária do Pará é bem rica e peculiar, além do estado ter muitos lugares com uma paisagem exuberante. “O povo paraense é muito simpático e acolhedor e há bons lugares para se morar na capital, em Belém”, comenta.

Ao ser convocado, quais documentos o aprovado deve ter em mãos?

Ao se interessar por um edital para trabalhar em outro estado, é importante conferir quais são os documentos exigidos para a posse, por exemplo. Vale citar que como a maioria dos concursos possui dois anos de validade, a convocação pode ocorrer durante esse período.

Aliás, como muitos certames possuem a possibilidade de prorrogar esse prazo para mais dois anos, a especialista em aprendizagem Laura Amorim não recomenda que o candidato mude para outra região logo após ser aprovado. “Pode ser que a pessoa fique quase quatro anos esperando a nomeação”, aponta.

Com isso, o que pode facilitar na preparação é cuidar e separar os documentos requisitados pelo certame. Mariana elenca os itens que costumam ser pedidos. Confira abaixo:

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Assim, a consultora educacional Raquel Medeiros fala sobre a importância de prestar atenção no cronograma do edital, pois nele estarão as datas de entregas dos documentos e da posse em outro estado, por exemplo.

“Uma dica que aprendi com a carreira acadêmica é sempre manter uma pasta organizada com os documentos originais exigidos e as suas cópias autenticadas, além de itens digitalizados, em algum drive”, finaliza.

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